Degraus, um a um.
Sobe Jane no ônibus, sentindo a brisa do ar condicionado –
impressionando-se com tal, já que o mesmo aparenta estar caindo aos pedaços.
Curioso, o ônibus se parecer tanto com o estado de espírito que
ela se encontrava.
Sweet Jane acena para o motorista, sapateia até seu acento
ao lado da janela.
O banco cheira mofo, livro velho e teia de aranha, Jane
torce o nariz, joga a mochila entre as pernas.
O ônibus arranca, Sweet Jane fita as paisagens que seguem
pela janela, as imagens distorcidas pelo vidro escurecido, o céu nublado sopra
as nuvens de algodão para longe, evitando que atrapalhem seu quase-breu-não-noite.
Só o céu.
Ó céus.
O veiculo para, sem o movimento a calmaria se esvai, com
muita balburdia sobe a criança mais graciosa aos olhos tempestuosos de Jane. Ela
tem o rosto fino, magricela, cabelos negros muito lisos escorrem calculadamente
divididos pelos ombros da garota, ela – a criança – fala alto, escandaliza, faz cabeças doerem.
Jane cerra os olhos tentando afastar os grunhidos da nova
passageira, e é surpreendida quando a mesma pula para o banco ao seu lado,
sorridente – sem alguns dentes, ela balança os pés, bate palmas, chacoalha as
madeixas negras que mal saem do lugar de tão finas e pesadas, mexe na mochila de
Jane, que abre os olhos e encara a criança, que a encara de volta – a menina
tem os olhos tão grandes e negros quanto os cabelos, a pele que parece porcelanato branco
destaca-se em meio a tanto escuro, ela para de sorrir e mostra a língua.
Sweet Jane sente seus globos oculares pararem na nuca da
maneira que revira os olhos, solta um suspiro e dá de ombros, onde está a mãe desse pequeno ser humano?
Tenta voltar sua atenção a rua através da janela, mas o ônibus
para novamente. Jane não percebera, mas já havia passado algum tempo que a nova
passageira se encontrava ao seu lado, cutucando-lhe - não de forma literal.
A garota cutuca Jane – agora literalmente.
– Hm? – adulta.
– Qual seu nome? – criança.
– Jane. – suspiro e dedos nas temporas.
– Não vai perguntar qual o meu? – sorriso sem dentes e dedos
espalmados nos joelhos pequenos.
– Qual seu nome? – impaciente.
– Insônia. – gargalha e retira-se, a menina se esvai como poeira de carvão.
A mesma visita de sempre, devia ter se lembrado dela. Serelepe
como uma criança órfã, desentendida, ansiosa, escandalosa e não sutil
como uma enxaqueca.
com uma enxaqueca.
Sweet Jane revira na cama, acende o abajur no armarinho ao
lado.
Não havia ônibus,
nem menina,
só cheiro de mofo, livro velho e teia de aranha,
Mas, não se sentia sozinha dessa vez.
Afinal podia senti-la ali.
Ela, tão graciosa que faz com que queiramos a arrancar
nossos próprios olhos
sorrateira,
infame,
inconveniente,
curiosa.
a menina.
a Insônia.
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